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quarta-feira, 19 de setembro de 2012

O Relógio do Tempo Nunca Pára

O relógio do tempo nunca pára
A 2012/2103 segue-se 2013/2014

Em maio, fui convidada a intervir num encontro sobre Developing Inquiry based Science Education (IBSE): the roles of assessment and the relationship with industry, em Helsínquia.
O encontro foi organizado pela ALLEA (Federation of 53 National Academies of Sciences and Humanities) em colaboração com a IAP (Inter-academy panel global science education programme from Finland).
O objective principal era reflectir sobre vários temas de educação e ciência com especial enfoque para a chamada "Science Based Education".
Sobre este assunto muito haverá a dizer mas realmente o que quero realçar agora foi é a interessante apresentação de Mrs. Armi Mikkola do Ministério de Educação da Finlândia sobre a reforma educativa, que foi considerada uma base para que a Finlândia saísse da crise em que mergulhou em 1990. Apesar da crise, e durante a crise, o valor investido em Educação aumentou sempre (e ainda mais durante o período agudo da crise).
A base da reforma educativa da Finlândia assentou sobre os seguintes princípios:
1. A escola tem que ter qualidade e essa qualidade tem que ser assegurada para todos;
2. A reforma deve ser evolutiva e nunca revolucionária;
3. O sucesso das escolas tem consequências a nível sociopolítico e económico, e constitui uma responsabilidade de todos;
4. O respeito pelos profissionais da educação, professores e pessoal não docente, o seu envolvimento e a aplicação generalizada das boas práticas devem ser utilizadas para construir consensos e uma visão reformista.   

Perguntar-me-ão a que propósito vem, agora, este assunto?

Principalmente pelo ponto 2 (não que os outros não sejam igualmente importantes): a reforma deve ser evolutiva e nunca revolucionária!

Infelizmente, em Portugal, cada novo Governo (por vezes até o mesmo governo cada novo ano) entende revolucionar o sistema sem acautelar a inserção das medidas num planeamento estratégico e consensualizado. Esta prática conduz a um desperdício de tempo e de energia. Verificou-se, verifica-se, isso com a adopção da reforma de Bolonha, a acreditação dos cursos, o financiamento do ensino superior, o modelo estrutural das universidades.

Vejamos o que se passou em Portugal desde 2006:

a)                  Reforma de Bolonha
O Decreto-lei 74/2006 lança a reforma de Bolonha. 
Em 2007/2008 todos os cursos foram "adequados". Para tal foram "avaliados" pela DGES e reconhecidos, e novos cursos foram submetidos à DGES para aprovação.
O Decreto-Lei nº 369/2007 determinou a criação da Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior (A3ES). A A3ES iniciou a sua actividade em 2009.
A partir de 2010 procedeu-se:
1.       À acreditação preliminar de todos os ciclos de estudo em funcionamento à data da criação da Agência;
2.       À acreditação prévia de novos ciclos de estudos e à preparação dos processos de auditoria dos sistemas internos de garantia da qualidade.
A partir de 2012 iniciou-se o primeiro período regular de acreditação de todos os ciclos de estudos.
Portanto, desde 2006, procedeu-se:
1.       A um registo, na DGES, para adequação de cursos;
2.       A um registo, na DGES, de novos cursos;
3.       A uma acreditação preliminar, pela A3ES, dos cursos anteriores;
4.       A uma acreditação prévia de novos ciclos, pela A3ES
E…. finalmente
5.       Ao primeiro período regular de acreditação.
(basicamente estamos, quase sempre, a falar dos mesmos cursos)
Todos estes processos ocuparam tempo, implicaram trabalho, mobilizaram recursos e pesaram nos orçamentos.  
Ninguém refilou mas, na realidade, houve um ENORME CUSTO imputado às Universidades que não foi por elas decidido, e que deriva do facto do Dec-Lei 74/2006 ter saído antes do Dec-Lei de criação da agência em 2007; ou seja, é da inteira responsabilidade do Ministério.
E os orçamentos foram sempre baixando…anualmente!
Há neste processo um final feliz! Os cursos aprovados pela A3ES têm, como que, um selo de qualidade.
Em reunião de 13 de Junho de 2012 do European Consortium for Accreditation (ECA), a Agência A3ES foi aceite como membro do Consórcio, passando a subscrever o acordo de cooperação ECA para o período de Janeiro de 2012 a Junho de 2015.
Ou seja, o reconhecimento de qualidade nacional é de âmbito internacional.
Chegamos pois à conclusão que, podendo haver diferenças de qualidade entre os vários cursos nas várias instituições, pelo menos ultrapassam um limiar mínimo de qualidade.  

b)                  Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior

Ainda em 2007, foi publicado o “Novo Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior” RJIES (Lei n.º 62/2007).

De acordo com esta Lei, as instituições de ensino superior refizeram os seus estatutos (envolveu tempo/trabalho=custo). Passados 4 anos, segundo a mesma lei, as IES poderiam rever os seus estatutos. A Lei instituía a título facultativo o regime fundacional. Várias Universidades debateram o assunto (em reuniões que envolveram tempo/trabalho), ponderaram, reflectiram, reuniram-se com o ministro com o secretário de estado; enfim: reflectiram e investiram esforço.
Três universidades (U. Porto, U. Aveiro e ISCTE) optaram por aderir a este modelo, com todas as consequências que daí adviessem (vantagens e inconvenientes)
Ao passarem a Fundações, as Universidades assinaram contratos-programa com o Governo, ao abrigo dos quais receberam “fundos” cujos montantes se situam 20 a 60 milhões de € (os contratos não estão disponíveis).
Os contratos tinham a duração de cinco anos (aproximadamente vigentes até 2014-2015).

Estas Universidades investiram, durante 5 anos (desde a tomada de posse dos seus C. Gerais), tempo e energia para que as decisões de adesão a um modelo de organização, que a Lei lhes facultava, fossem democraticamente legitimadas.

Finalmente...
Em 2 Agosto 2012, na cerimónia de assinatura do Protocolo de fusão entre UTL e UL, o ministro Nuno Crato afirmou que o governo "proporá, no âmbito da revisão do regime jurídico das instituições de ensino superior, a extinção do actual regime fundacional e a criação de um novo regime de autonomia reforçada" à semelhança daquele que é pretendido pelas duas instituições que agora se irão fundir.  

A seco! Assim de repente!
Na reunião com os Reitores, de 3 de Agosto de 2012, Nuno Crato, garantiu que a intenção de criar um novo sistema de autonomia reforçada, que na véspera anunciara, levará em linha de conta "o que as universidades-fundação já conseguiram", disse ao Expresso o reitor da Universidade de Aveiro: "O nome fundação cai, mas mantém-se nesse regime tudo o que as universidades-fundação já conseguiram, nomeadamente, as vantagens do ponto de vista de gestão e acrescentou, penso que não podia ser de outra forma".
Pois eu penso que para ser desta forma não valia a pena a "confusão"!
Realmente já não se sabe afinal como vai ser!?
Parece que o RJIES vai ser revisto (passaram 4 anos desde as aprovações, pelas Instituições, dos novos estatutos) no momento em que as Universidades estão a começar a aprovar as primeiras alterações aos anteriores estatutos ou seja, após reflectirem e interiorizarem o novo modelo (o RJIES) vão (iam?) fazer as primeiras correcções!

Ninguém refila mas, na realidade, haverá, mais uma vez, um ENORME CUSTO imputado às Universidades que não foi por elas decidido, e que deriva do facto de uma lei estruturante para as IES, o RJIES, se vá alterar 4 anos após ter sido aprovada quando ainda não pode haver, efectivamente, uma avaliação correcta dos seus erros ou das suas virtudes.

c)         Novo modelo de financiamento

O que despoletou a reunião de 3 de Agosto do CRUP com Nuno Crato foi o novo corte orçamental de 2%, em média, previsto para 2013.
As regras para atribuição das dotações estatais foram diferente este ano (mas serão diferentes ainda para o ano)!
Na definição do orçamento para 2013 "o que se fez foi utilizar uma fórmula com peso de 15% (para os dados de 2012), ficando a distribuição histórica com peso de 85%", revela uma fonte do Ministério da Educação e Ciência.
Uma fórmula "construída de modo a reflectir a situação de cada instituição num dado momento: número de alunos e respectivos cursos, custos com pessoal docente e não docente".
Nada explica, objectivamente, por que razão esta fórmula é melhor que a anterior (também nunca se explicou porque se assinou um contrato de confiança (o governo anterior) e nunca se cumpriu, porque os contratos com as Universidades Fundação (assinados pelo governo anterior) não estão a ser cumpridos por este governo, nem porque contratos programas pontuais assinados com objectivos específicos com algumas Instituições também não têm sido cumpridos).
Recorde-se que Nuno Crato, ministro da Educação e Ciência, tinha prometido alterar o modelo de financiamento do ensino superior este ano.
Mas ainda não foi desta! O ministério admite que "este não é o modelo para o futuro".
O mecanismo utilizado no cálculo das verbas teve como objectivo fazer a "correcção parcial das distorções acumuladas por anos de aplicação do histórico, ou seja, variações iguais para todas as instituições", sublinha fonte do MEC.
Garante-se que esta fórmula corrigiu distorções (sejam elas quais forem porque há anos que a formula utilizada não está fixa)!
Ou seja, mexeu na fórmula, sem explicar primeiro e mesmo sem explicar porquê, mas sabe-se que esta "mexida" não é para manter, para o ano há mais!
O quê?
Não sabemos!

Sabemos que:
·                     É impossível delinear estratégias a longo prazo, porque o governo não tem uma estratégia a longo prazo!
·                     É impossível prever orçamentos, logo delinear planos de actividade, porque tal como de uma ano para o outro se pagou S. Social, ou acreditação de cursos ou b-on e FCCN, por exemplo, sempre que entenderem farão pagar, o que quiserem, porque não há uma estratégia a longo prazo por parte do governo!
·                     Sabemos que o País atravessa uma crise ENORME!
·                     Sabemos que as Universidades/Fundação assinaram contratos-programa com o governo (que o governo não cumpriu correctamente em alguns casos) que envolveram verbas à volta dos 60 milhões €.
·                     Sabemos que todos os cursos em funcionamento nas Universidades públicas foram avaliados pela A3ES; 
·                     Sabemos que a UTL e a UL querem ser a maior Universidade do país e querem uma autonomia reforçada (não sabemos o que isto quer dizer!); 
·                     Sabemos que os orçamentos brutos desceram regularmente desde 2005 se bem que os salários, tirando recentemente, iam aumentando, e os custos de tudo, energia, bens alimentares, telefones etc.. .também (pelo que o decréscimo de financiamento é ainda maior).

Não sabemos:
·                     Se o governo vai deixar que o sistema se "auto-regule" asfixiando, lentamente, as universidades do interior?
·                     Se o governo faz tensões de ter uma elite no litoral e deixar o interior a "sobreviver"?
·                     Se o governo tem uma estratégia para o Ensino Superior ou se prefere deixar perder uma geração?
·                     Não sabemos que alterações vai haver no RJIES nem para quando?
·                     Que alterações terá o modelo de financiamento nem para quando?

Gostávamos de ter tempo para nos podermos "adequar" à visão do governo, se ele a quiser definir de uma forma aberta, para podermos delinear uma estratégia coerente e com tempo e a longo prazo!
Gostávamos de não estar sempre a "inventar a roda"!
Gostávamos de ter uma reforma evolutiva, (não revolucionária) consensual e, que se acordasse em fazer um pacto de regime para a Educação Superior.
Vem nos Livros: não é possível delinear uma estratégia se nunca se sabe o que vai acontecer, ou com que podemos contar.
Já em 29 de Outubro de 2010 escrevi aqui:
Vamos tentar pensar no futuro!?
Passaram dois anos, temos menos dinheiro, a crise instalou-se definitivamente, e NADA REALMENTE aconteceu que faça pensar que há uma estratégia sem ser "deixar morrer de asfixia financeira as Universidades mais pequenas e assim regular o sistema!"
Não é justo para quem lá trabalha, não é justo para quem lá estuda, não é justo para as regiões!
Principalmente, não é justo para o País que se demore tanto tempo a resolver esta situação!

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